Professores Munduruku trancam secretaria de educação após demissão em massa

Posted: March 13th, 2014 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on Professores Munduruku trancam secretaria de educação após demissão em massa

publicado por: Reporter Brasil

Escrito por: Larissa Saud

Demissão de 70 educadores foi feita por rádio e deixou centenas sem aula. Apenas indígenas foram dispensados. Prefeitura de Jacareacanga (PA) nega perseguição

Indígena exibe cartaz com reinvidicações em Jacareacanga (PA). Fotos: Kabaiwun Kaba, vulgo Leusa kaba

Indígena exibe cartaz com reinvidicações em Jacareacanga (PA). Foto: Kabaiwun Kaba

O ano letivo mal havia começado nos afluentes do Tapajós, quando cerca de 70 professores indígenas da etnia Munduruku ouviram seus nomes nos rádios das aldeias. A ordem era para que deixassem as escolas. Estavam despedidos e centenas de alunos ficariam sem aulas por tempo indeterminado. Após o comunicado, educadores começaram a descer das aldeias até a cidade para exigir recontratação. A mobilização culminou no trancamento da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Desporto (SEMECD) de Jacareacanga, oeste do Pará, fechada pelos educadores desde segunda-feira, dia 10.

Eles exigem readmissão imediata de 70 professores, demitidos no final de fevereiro pela prefeitura, cobram a saída do secretário e melhorias na educação: “Nós, povo Munduruku, queremos respeito. Nós não somos analfabetos, somos educadores. Queremos a demissão do secretário de educação já. Fora Pedro Lúcio! Fora! Fora! Queremos uma educação de qualidade! Queremos respeito, secretário!”, diz a carta pública apresentada pelos indígenas.

Ouça a carta com as demandas dos Munduruku

Eles cobram também a presença de várias instituições em Jacareacanga, como a Fundação Nacional do Índio de Brasília, Ministério da Educação, Ministério Público Federal e Ministério Público do Trabalho.

 “Achamos isso um desrespeito com os direitos dos povos indígenas. Queremos o retorno imediato dos professores para as aulas”

Demissão seletiva
Os indígenas denunciam que apenas os professores indígenas foram demitidos, enquanto os não-índigenas na mesma situação continuarão dando aulas. Além disso, dizem que os novos professores não dominam as disciplinas, principalmente as de artes, língua materna, cultura indígena, e muitas vezes não sabem falar munduruku, deixando vários alunos sem entender as aulas. “Achamos isso um desrespeito com os direitos dos povos indígenas. Queremos o retorno imediato dos professores para as aulas”, afirma Paigomuyatpu Manhuary, ex-professor do 4º ano de ensino geral na aldeia Caroçal Rio das Tropas.

“É a primeira vez que isso acontece. Desde 2007 que eles trabalhavam. A gente quer que eles recontratem os professores. Reunimos, reunimos e não definiram nada. Aí fechamos a Secretária. Vai ficar fechada até eles resolverem isso”, explica Kabaiwun Kaba, membro do Movimento Munduruku Ipereg Ayu.

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Munduruku escreve cartaz com demandas. Foto: Kabaiwun Kaba

A maioria dos professores demitidos faz parte do projeto Ibaorebu, coordenado por André Ramos, indigenista e historiador. O curso técnico de oito anos tem como objetivo formar os indígenas em três áreas: enfermagem, magistério e agroecologia, o que possibilitaria a contratação dos mesmos. A primeira turma iria concluir o curso no início deste ano, porém houve atraso na oferta das disciplinas, o que fez com que o término fosse adiado para o final do ano.

Demitiram só os professores do Ibaorebu. A gente acha que isso é pra intimidar a gente. Agora várias aldeias estão todas sem aula”

Paigomuyatpu acredita que a decisão da Prefeitura é uma retaliação à fiscalização realizada em janeiro pelos Munduruku nos garimpos localizados em terras indígenas. Na ação, vários garimpeiros não-indígenas foram expulsos, e os maquinários, apreendidos. “Demitiram só os professores do Ibaorebu. A gente acha que isso é pra intimidar a gente por causa da fiscalização. Agora várias aldeias estão todas sem aula. Eu já falei para alguns vereadores: Se vocês não resolverem isso, não teremos mais acordo nenhum”, concluiu Paigomuyatpu Manhuary por telefone.

A prefeitura nega perseguições. Segundo João Kaba, coordenador de educação Indígena do município, a motivação da prefeitura para as demissões é a falta de formação dos professores: “Eles não tem curso superior, só fundamental. Eles não são concursados, são temporários. Todo final de ano acaba os contratos e esse ano não renovamos com eles. Vamos fazer a substituição”.


Em Altamira, atingidos por enchente ocupam reassentamento de Belo Monte

Posted: March 4th, 2014 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on Em Altamira, atingidos por enchente ocupam reassentamento de Belo Monte

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Na manhã desta terça-feira (4), por volta das 9h, dezenas de famílias de Altamira que tiveram suas casas alagadas pela enchente do rio Xingu ocuparam o reassentamento Jatobá, que deverá receber os despejados por Belo Monte. Depois de algumas horas e sem que ninguém da Norte Energia aparecesse para negociar, as famílias ocuparam cerca de 100 casas, muitas ainda no concreto e sem pintura.

“Essa é a casa que queremos?”, perguntava uma manifestante com o megafone em mãos, enquanto os outros ecoavam: “Não! Mas é melhor do que ficar em baixo da água”. De acordo com as famílias, a ocupação foi uma resposta à demora na entrega das casas, à falta de informação sobre a situação dos cadastros e ao aumento no nível das águas do Xingu e dos igarapés de Altamira, que nos últimos dias têm invadido casas e causando transtornos em vários bairros da cidade, como Aparecida, Açaizal, Tufi e Boa Esperança. “A Norte Energia diz que o remanejamento é por área e por bairro, mas nunca chega na minha casa. A obra [de Belo Monte] já está com dois anos aí, já construíram um monte de coisa e o povo não recebe nada”, denuncia um morador de Boa Esperança.

Segundo Assis Oliveira, que presta assistência jurídica aos manifestantes, as reivindicações seguem duas linhas: tentar moradias temporárias com a Prefeitura de Altamira, enquanto e negociar com a Norte Energia um prazo para que as famílias da manifestação sejam alojadas.

No final da manhã, por volta das 12h, alguns representantes da Norte Energia chegaram ao local. As negociações seguiram até o fim da tarde, quando foi tirada uma comissão para dialogar com a empresa. 

Cheia desespera zona rural
A cheia do rio Xingu é normal durante o chamado inverno paraense, quando o índice pluviométrico aumenta na região. Porém, segundo pescadores e ribeirinhos, o nível das águas tem subido consideravelmente nos últimos dois anos devido ao avanço das obras de Belo Monte. “A gente tá aqui há quatro anos. É a primeira vez que a casa alaga. As crianças e todas nossas coisas estão aqui. A água está com mais de 10 centímetros dentro da casa”,  afirma Zila Datena Tavares Kaypó, moradora da ilha do Murici, situada a 30 minutos de voadeira abaixo do canteiro Pimental. Segundo Zila, as águas do rio não param de subir desde a ultima quinta-feira, quando foi noticiado que uma ensecadeira do sítio teria rompido, conforme a agencia de noticias Altamira Hoje.

Zila, que estava em Altamira com os filhos no hospital, soube por terceiros que sua casa estaria sendo levada pelo rio devido ao rompimento da ensecadeira. A pescadora se encaminhou imediatamente até a Ilha, onde encontrou a casa alagada. Ela então pediu socorro a Norte Energia, que encaminhou um funcionário até o local. O funcionário informou que nada poderia fazer enquanto a empresa não fosse notificada formalmente. A família de 11 pessoas está sendo resgatada pelo irmão de Zila desde as 8h da manha de hoje (04), mas até agora só foi possível retirar alguns móveis e mantimentos.

Por Larissa Saud, de Altamira


No Pará, indígenas apreendem máquinas e expulsam garimpeiros

Posted: February 5th, 2014 | Author: | Filed under: Geral, Mundurukania | Comments Off on No Pará, indígenas apreendem máquinas e expulsam garimpeiros

Por Larissa Saud

Fotos por Adailton Paihun-

publicado também no Blog da Amazônia

Ameaçados de morte, munduruku expulsaram garimpeiros de terra indígena no extremo oeste do Pará

A noite mal havia chegado quando índios da etnia Munduruku atracaram na ribanceira de um garimpo localizado no Rio das Tropas, afluente do Rio Tapajós, na região oeste do Pará. Das cinco voadeiras, todas lotadas, saíram guerreiros, guerreiras e crianças, todos com um objetivo: expulsar garimpeiros ilegais da terra dos Munduruku.

Logo na entrada do barracão, os indígenas depararam-se com dois dos 12 garimpeiros presentes no local. Pintados para guerra, os Munduruku foram firmes.

– Vocês tem dez minutos para ir embora. Pega as coisas de vocês, vão embora e não voltem mais. Isso aqui é terra dos Munduruku – ordenou Paigomuyatpu, chefe dos guerreiros, enquanto os garimpeiros arrumavam as mochilas e se preparavam para abandonar a área.

Segundo os trabalhadores presentes no garimpo, os quatro pares de dragas, modelos MWM de 3 e 4 cilindros, utilizados para extração de ouro, pertencem a Alexandre Martins.

Conhecido como Tubaína, Martins também é dono de pelo menos mais dois garimpos na região, e deixara o local três dias antes da operação, exatamente quando os Munduruku iniciaram a vistoria na bacia do Tapajós.

– Ele [Tubaína] disse que ia lá pro outro barraco dele. Ele não tá lá, não tá aqui. Ninguém sabe – afirmou Mara Almeida, que cozinhava nos barracos para os garimpeiros de Tubaína.   A ação se deu após inúmeras denúncias protocoladas em órgãos governamentais. Ozimar Dace, Munduruku membro do movimento e relator da operação, contou que os indígenas já haviam tentado retirar os pariwat (não indígenas) do território por meio do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Fundação Nacional do Índio (Funai).

– A gente decidiu que essas autoridades nunca ia dar resultado pra gente. Eles nunca iam fazer isso pra gente poder viver sossegado. Eles davam o prazo de que eles iam dar resultado, mas isso nunca saiu. Então, por esses motivos, a gente decidiu resolver por conta própria.

A exploração ilegal de garimpo dentro da terra indígena Munduruku é antiga. Relatos remontam o início dessas atividades à década 1980. Uma história de ameaças, acordos com um pequeno grupo de lideranças e exploração da mão de obra indígena tecem uma teia que não beneficia a maioria do povo.

Segundo as comunidades locais, os garimpeiros têm causado vários problemas nas terras indígenas devido à exploração descontrolada. Poluição do rio, falta de peixes, desentendimentos e ameaças são os principais motivos apontados  como estopim. Por essas razões, os indígenas estariam “tirando garimpeiros e tomando os seus maquinários”, explica Paigomuyatpu, chefe dos guerreiros Munduruku.

– Os garimpeiros já fizeram prejuízos demais no nosso território. Estamos evitando problemas, doenças e muitas coisas que estão acontecendo. A gente tá evitando isso aí pra nossa futura geração – acrescentou.

Parte do grupo de garimpeiros expulso pelos indígenas

A fiscalização começou no dia 15 deste mês, durou quase vinte dias, e passou por vários afluentes da bacia do rio Tapajós, como Rio das Tropas, Kaburuá, Kadiriri e Kabitutu. No total, os Munduruku confiscaram doze dragas, que ficarão paradas por um mês nas aldeias, quando os indígenas decidirão o que fazer.

– Em relação aos garimpos, vai ficar parado. Depois vai passar um mês e a gente vai decidir o que vai fazer com o maquinário: se fazemos projetos para beneficiar a comunidade nas áreas onde já estão as máquinas. Mas nós precisamos de projetos alternativos de geração de renda para a comunidade, como criação de peixe, produção de farinha, extração de castanha, copaíba e mel. Precisamos do apoio da Funai  – afirmou Paigomuyatpu.

Pressionada pelos Munduruku, a Funai apoiou a ação autônoma dos indígenas, financiando o combustível para as embarcações.

– Foi uma demanda deles, veio de uma pressão. Eles queriam de qualquer forma que isso acontecesse. A gente acha que tendo uma iniciativa que parta deles é até melhor, para que eles se entendam com os parentes e decidim que não vão mais permitir a entrada de garimpeiros – comentou Juliana Araújo, da coordenação da Funai de Itaituba.

De acordo com Juliana, desde quando chegou à região, em 2010, a Funai recebe denúncias dos munduruku sobre o garimpo ilegal na terra indígena. Em outubro do ano passado as denúncias foram reiteradas e encaminhadas para o ICMBio e Polícia Federal. Em 2012, uma operação na região teve efeito provisório porque depois houve o retorno dos garimpeiros. Por causa disso, foi sugerido à Funai trabalhar a conscientização dentro do plano de gestão.

– Não adianta só fazer a operação e depois alguns índigenas autorizam a entrada dos garimpeiros. A gente resolveu tomar um pouco mais de cuidado com isso. Tanto nós quanto o ICMBio, estamos com dificuldade pessoal. Tem só uma pessoa que é responsável por uma série de unidades Quando a gente vai fazer uma operação de monitoramento, tentamos chamar servidores de outros lugares,  porque os servidores locais acabam sendo alvo dos garimpeiros.

O clima é tenso na região. Comunicando-se através de rádios, as lideranças descobriram que estão sendo perseguidas. Há uma lista com pelo menos cinco nomes de líderes indígenas marcados para morrer. O autor das ameaças seria Tubaína. Segundo um guerreiro Munduruku, ele comanda um grupo de pistoleiros com armas automáticas 765.

– Tubaína é temido na região e anda com rifle na mão direto dentro da aldeia, ninguém fala nada. Eu falei: ó, dentro da terra indígena, somente a Polícia Federal e a Funai e se for autorizado ainda pra andar armado – relatou Valmar Kaba.   Além das lideranças, Tubaína também teria ameaçado o cacique da aldeia Posto de Vigilância (PV), Oswaldo Waro, e seu filho, João Waro. No último dia 19, os dois fecharam a pista de pouso da aldeia com galhos, paus e pedras para evitar que o garimpeiro retirasse as máquinas apreendidas.

– O Tubaína passou o rádio pro cacique e disse que quando o Oswaldo fosse pro trabalho dele, lá no Bananal, o Tubaina ia pegar ele e o filho dele – contou a indígena Leuza Kaba.   Um dos trabalhadores expulsos pelos Munduruku, conhecido como Baixinho, informou que os garimpeiros de Humaitá e do km 180 da Transamazônica estariam planejando ir ao Tapajós para “se acertar” com os indígenas.  Baixinho não revela seu nome verdadeiro. É franquizino e tem a fala mansa. Em uma mesa de bar, conta que há 14 anos, desde quando foi abandonado pela mulher, vive do garimpo.

– Só aqui na região trabalho há seis anos. O povo conta muita mentira sobre os garimpeiros. Falam muito do Tubaína, mas ele é uma pessoa boa e ajuda todo mundo- disse.

Ele se despediu dizendo que ainda vai voltar para tirar ouro dentro da área indígena. Alguns conhecidos contaram que Baixinho saiu do presídio há dois meses, que esteve preso por ter matado um homem a facadas em um garimpo próximo à aldeia Catõn, dentro da área indígena.

– E matou outro com um tiro de .20 bem aqui, nessa rua – diz um dos conhecidos dele.   A reportagem não conseguiu fazer contato com Tubaína. Na sexta-feira (31), lideranças indígenas registraram na delegacia de Jacareacanga um boletim de ocorrência denunciando as ameaças do dono de garimpo e informaram a situação ao Ministério Público Federal.

Carta

Em carta, os indígenas dizem que não temem as ameaças de morte e que continuarão lutando por seus direitos.

“Carta VI – Carta do Movimento Munduruku Iperêg Ayû

  Nós, caciques, lideranças e os guerreiros (as), viemos através desta cumprimentar os senhores e as senhoras. Aqueles e as aquelas que apoiam o nosso Movimento Munduruku Iperêg Ayû.

Nós, guerreiros (as), fizemos a nossa fiscalização do nosso território. Tiramos e expulsamos os garimpeiros invasores do nosso território e apreendemos os seus maquinários. Agora eles estão;nos ameaçando de morte, mas nós não nos intimidamos.

Esse é o primeiro passo. Vamos defender até o fim o nosso território, nosso rio, a nossa floresta, nossas riquezas e nosso povo. Essa é a nossa palavra. Finalizamos esta carta com muita paz e amizade. Sawe! Sawe! Sawe!   Atenciosamente, Movimento Munduruku Aperêg Ayû.   Aldeia Caroçal, Rio das Tropas, no Município de Jacareacanga, Oeste do Pará

Danos do garimpo dentro da terra indígena

 

Danos do garimpo dentro da terra indígena


MUNDURUKU X UHE’S >> Mapeamento (em) Processo

Posted: January 30th, 2014 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on MUNDURUKU X UHE’S >> Mapeamento (em) Processo
Cartografia em desenvolvimento sobre os processos de violência de estado X a resistência dos povos da floresta aos grandes projetos neocolonialistas para a amazônia

Cartografia em desenvolvimento sobre os processos de violência de estado X a resistência dos povos da floresta aos grandes projetos neocolonialistas para a amazônia

 

No dia 2 de novembro de 2013, o Amazônia em Chamas e o Laboratório de Cartografia partiram para a região do Tapajós com duas missões: documentar a reunião Munduruku ocorrida na aldeia pólo-base Restinga, produzindo material jornalístico a cerca do posicionamento dos indígenas diante da chegadas dos grandes projetos hidroelétricos na região da bacia do Tapajós, posicionamento este sempre invisibilizado nos grandes meios de comunicação; desenvolver junto ao Movimento Ipereg Ayu um mapeamento que fosse o relato da violência de estado despejada contra os povos da floresta no intuito de realizar a todo custo tais projetos, e da resistência desses povos diante do desrespeito do governo, incluindo ai seus órgãos, em tese, responsáveis por representar os interesses indígenas.

Nos intervalos da reunião, começamos a desenvolver essa cartografia, junto com alguns Munduruku que demonstraram mais interesse e habilidade com esse tipo de processo, alguns professores na escola Munduruku Ibaorebu. Nestes diálogos soubemos que eles já estavam fazendo um mapeamento próprio, englobando toda a ancestralidade desse povo, há muito conhecidos como cortadores de cabeças, único povo que conseguiu resistir ao avanço da etnia kayapó em direção ao oeste, agora, a marcha para o oeste é a marcha do neo-banderantismo, da colonização Brasil-Amazônia, isso também, estes sábios indígenas, que não paravam de nos surpreender, demonstraram claramente entender. Como entenderam também que nesse período neo-colonial, de capitalismo mundial integrado, monopolista, onde as corporações são mais poderosas que os estados, estamos todos nós Amazônidas no mesmo barco, seja na cidade, seja na floresta, descolonizar (ainda) é preciso, por isso somos aliados, por isso estamos juntos, por isso somos iguais, mesmo diferentes.

Trocamos conhecimento, daqui pra lá, e sobretudo (já que aqui somos nós falando) de lá para cá, trocamos ferramentas, construímos juntos a cronologia dos fatos, ícones para simbolizá-los, apresentamos outros mapas que continham esse caráter de relato-denúncia, mapas não só produzidos por nós em outros momentos, como o Mapazônia e Terra do Meio Zona de Guerra (disponíveis em http://labcart.hotglue.me/), mas também e principalmente, cartografias dos Colombianos do ‘Antena Mutante’, dos Iconoclassistas, Argentinos, legendamos vídeos-documentários, com o intuito de trazer a consciência desse povo em luta que eles não estão a sós, que assim como o capitalismo hoje funciona em uma rede mundial integrada, os processos de resistência, inclusive de povos indígenas, populações tradicionais, explodem nos quatro cantos do globo, faltando apenas muitas vezes a construção de uma via de comunicação entre as partes, ponte difícil de ser construída, sobretudo em uma região como a Amazônia, onde apenas 7% da população tem acesso à internet. Nesse sentido também, a relação travada nesses dias de convivência na Restinga foi apenas um começo de um trabalho que segue.

O mapeamento que começou em novembro de 2013, ainda não foi finalizado, nem teria como ser, pois o processo de violência corporativa-estatal que vem com os grandes projetos (demandas do exterior, legitimadas em Brasília) para a Amazônia, o que não significa dizer para os Amazônidas, ainda não se finalizou, consequentemente, tão pouco a resistência dos povos indígenas do alto do médio e do baixo Tapajós, Munduruku, Kayabi, Apiaka, se encerrou, e a eles, aos poucos, se juntam ribeirinhos, pequenos agricultores, e setores das populações urbanas, pois até os garimpeiros sabem que no pós barragem, como em Belo Monte, com a Canadense Belo Sun, as riquezas seriam – ou serão, lutamos para que não – monopolizadas por grandes corporações multinacionais com sede física e financeira no exterior, não restando a eles sequer um posto como funcionário diante de tanto maquinário, diante de tanta tecnologia, de tanto desenvolvimento(?)

O Mapa Ipi Ibuixy Ikukap (Território Munduruku em munduruku) aqui apresentado é apenas uma etapa desse relato, dessa história que ainda não teve fim, está portanto sujeito a mudanças, pontos serão aprofundados, outros ainda estão por vir, o que fica pra mim que agora escrevo é a necessidade de fortalecer a autonomia desse povo, não só diante desse conflito atual, contra as barragens (contra as empreiteiras, contra o governo por elas financiado), mas também para o depois, trata-se a meu ver de um fortalecimento de múltiplas dimensões, em múltiplas direções, e sem dúvidas, nós pariwati (branco) somos nisso tudo os coadjuvantes, porém coadjuvantes necessários. Estamos todos juntos. Descolonizar (ainda) é preciso!

 


Impressões de uma revisita à Volta Grande do Xingu, onde se instalou um Belo (?) Monstro, em Altamira

Posted: December 12th, 2013 | Author: | Filed under: Geral, Xingu Vive | Comments Off on Impressões de uma revisita à Volta Grande do Xingu, onde se instalou um Belo (?) Monstro, em Altamira

Publicado originalmente no blog Racismo Ambiental

Também cedido ao Amazônia em Chamas, pela autora.

Foto: Atossa Soltani/ Amazon Watch/ Spectral Q
Junho de 2012. A escavação para libertar o Xingu. Foto: Atossa Soltani/ Amazon Watch/ Spectral Q

Por Núbia Vieira

Imagem feia a que vem nos olhos, o rio sendo barrado, uma parede coberta de brita de repente o invade. Onde se instalou a empresa Norte Energia, árvore já não tem; “pelaram” morros, deve ser por medo de bicho.

Os índios Juruna, de autodenominação Yudjá, que quer dizer “donos do Rio”, não podem mais viver do Rio na região da Volta Grande do Xingu. Lembro-me de Bel Juruna naquela ocupação de junho-julho de 2012 que durou 21 dias e envolveu quase todas as etnias de Altamira. O que ela mais fervorosamente dizia em relação às condicionantes era isso: “não somos agricultores, vivemos do rio, não sabemos viver de roça e nem queremos viver de roça”. E agora está a Engetec Agrar empresa contratada pela Norte Energia para executar o PBA indígena de Atividades produtivas, levando mudas e mudas de cacau, abrindo área de plantio no trator.

Nas duas Aldeias que passamos estavam lá entulhadas manivas secas vindas ninguém sabia ao certo de onde: “a NESA quer que vocês plantem mandioca”. Mas, segundo as duas Aldeias, a maniva está seca, já não presta para plantar, apesar de que os diplomados engenheiros agrônomos não “botaram reparo” em tal fato e assim preferem acusar os índios de preguiçosos. Aliás, prática comum entre colonizadores em vários tempos históricos: quando estão a usurpar o Território e o modo de vida de um povo, acusam-no de preguiçoso, e eles, os que fazem grandes derrubadas, constroem muros no meio do Rio, esses sim são exemplos de trabalho e prosperidade.

Assim, o que poderá vir desse  pensar colonizador não é mais que milhares de pés de cacau e hectares de sementes híbridas de milho, ambos plantados em sistema de monocultivo.  E para além da insensibilidade desses homens que estão a pensar a produção nas Aldeias, há uma exigência que é a de mostrar serviço: a NESA precisa de uma foto para mostrar em seu site, comprovar que cumpriu “todas as condicionantes” e já não tem mais dívida com índio. Esta é uma das condições  para que seja emitida, sem contestações, a licença de operação para funcionamento da Barragem, provavelmente em 2015.

E diante da necessidade da “foto”, a monocultura de cacau e milho saem melhor. A produção pensada pela Engetec Agrar não foge, de modo algum, da linha do agronegócio: insumos químicos, monocultivo, plantação em larga escala, toda a produção voltada ao mercado. E o que alertava Bel Juruna em 2012 é exatamente que os Juruna nunca produziram roças para o mercado. Plantavam para a subsistência, e o Rio, além do peixe para alimentação familiar, lhes dava a alternativa de comercialização e assim de renda.  O que acontece é que o Rio que passa na frente da casa desses Juruna irá ficar boa parte do ano seco; o período de verão irá aumentar. Além disso, já atualmente a água está poluída, vira e mexe a obra de Belo Monte libera algum tipo de produto químico que desce o rio. E foi numa dessas que várias crianças das Aldeias da Volta Grande, e inclusive adultos, se contaminaram com essas substâncias tóxicas, tiveram lesões na pele e foram acometidas por diarreia.

Diante da crítica de “linha agronegócio”, os representantes do PBA – Componente Indígena de atividades produtivas poderão até justificar que estão seguindo os preceitos da Agroecologia, conforme tem sido recomendado para o trabalho com populações indígenas. Ora, infelizmente tanto a Agroecologia como outros termos e bandeiras de luta dos povos do campo são comumente mal utilizados e mal interpretados. E através de rasos argumentos sobre o que é agroecologia essas pessoas legitimam as suas invasões culturais.

Um processo de desmonte cultural de um povo não pode em hipótese alguma ser chamado de agroecologia. Logo, se o povo vive do Rio e da roça de subsistência, aí está o processo Agroecológico, que remete à verdade do jeito de produzir e viver secularmente e se dura há tantos anos é porque há harmonia e respeito na forma de lidar com os recursos naturais. Não será plantando cacau orgânico que se vai substituir este processo secular sem gerar peso na consciência.

Para o caso da água do Rio, já imprópria para consumo, a condicionante exigiu da NESA que perfurasse poços artesianos nas Aldeias. A água de quase todos os poços está salobra e com ferrugem.

A atividade da caça também já sofre impacto; a luz e o barulho da explosão de bombas que vêm do canteiro de obras espantam os bichos.

Mas essa viagem por esse circo de injustiças não para por aí. Dois dias antes da nossa visita, a NESA havia destruído o cemitério de mais de 100 anos da comunidade Arroz Cru, comunidade ribeirinha localizada ali na Volta Grande.

Foi o senhor Alexandre, o único morador que ainda resta naquela comunidade, quem relatou a situação. Ele e outros parentes de pessoas ali enterradas foram convidados pela NESA a assistir à destruição e a se responsabilizar pelas ossadas. Ali foram enterrados o avô e avó, a mãe e o pai e dois filhos de Seu Alexandre. E assim ele resumiu o sentimento que teve diante da cena: “Para mim parecia que alguém novo tinha acabado de morrer”.

Seus avós vieram do Ceará no início do século XX, por volta de 1910, pelo que nos relatou, para cortar seringa nas colocações da Volta Grande do Xingu. E não só os antepassados de Seu Alexandre, mas todos os outros que fundaram a comunidade Arroz Cru. Camponeses pobres vindos do Ceará, da Paraíba, do Rio Grande do Norte, todos inspirados na missão da primeira leva de soldados da borracha. Ali viveram da extração da seringa, por algum tempo da caça do gato para a venda de peles, então exportadas para a Europa. Essa história é a mesma de outros tantos ribeirinhos do Xingu originários dos bolsões miseráveis do Nordeste Brasileiro. Histórias assim são ouvidas, no município de Altamira, muitas vezes nas Reservas extrativistas criadas pelo Estado.

A comunidade Arroz Cru ali enfrentou de tudo: a malária, as pragas, os patrões que nessa época costumavam tratar seringueiro como escravo, os ataques dos “índios bravos”, a mudança drástica de hábitos (do semiárido para a Floresta). Foram tantos desafios, tanta coisa que se viu e viveu, e mal sabia esse povo que um dia teria que sair desse Território ao qual a duras penas se habituaram para dar lugar à geração de energia e ao progresso. Progresso que sempre os negou.

Eram 11 famílias. Todas tiveram que sair, exceto Seu Alexandre, que vai ficando até o dia em que, como ele mesmo explicou, “precisarem de sua área”. Não se sabe como está o processo de indenização de todas as famílias. Seu Alexandre irá receber um lote em Brasil Novo, município vizinho. No entanto, na sua nova morada não há rio perto e nem mata que lhe dê condições de caçar, ainda que tanto ele como os filhos tenham como principal hábito alimentar a ingestão de caça e peixe. Tendo a partir de então que comprar boa parte da despesa, a solução será o trabalho a dia em fazendas vizinhas. E assim o ribeirinho que antes era soberano em seu Território vai empregar sua mão de obra nas fazendas de gado e cacau da região, a parcos salários, com a única finalidade de ter o que comer.

O sentimento de Seu Alexandre, de morte de alguém querido, ilustra bem a destruição que vem provocando a construção da UHE Belo Monte. É a morte da memória, do lugar onde se desenhou toda uma vida.

Não se trata simplesmente de opiniões opostas, de ser contra ou a favor de Belo Monte, contra ou a favor do progresso, como gostam de mencionar a NESA e o governo, com seu posicionamento institucional. Trata-se de uma questão humana, de se repeitar a vida. Ou é, ou não é.

A UHE Belo Monte está sendo construída em cima de um Território. Território rico e diverso, cheio de histórias e memórias encravadas na terra, no corpo e nos sentimentos de seus habitantes. O cemitério da comunidade Arroz Cru é só um dos exemplos de marcas de ocupação, de memória desses povos que ali ocupam há séculos.

Também nos foi informado por trabalhadores da obra que nas áreas próximas ao Barramento, onde está sendo desmatado, tem-se encontrado cacos de cerâmica, machadinhas, utensílios indígenas, de gente que historicamente perambula por aquelas bandas. Dizem que até ossada humana já encontraram, o que é bastante provável, já que a Amazônia não é um simples vão verde como mostram as imagens de satélite.

***

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A ensecadeira barrou o rio Xingu, a cerca de 300 metros da comunidade já destruída por Belo Monte, Santo Antônio. Arquivo pessoal Amazônia em Chamas, fotografia analógica.

Impactos da UHE Teles Pires na voz de um Apiaka

Posted: December 11th, 2013 | Author: | Filed under: Geral | Tags: , , , | Comments Off on Impactos da UHE Teles Pires na voz de um Apiaka

A cachoeira das Setes Quedas, que agitava águas amazônicas e era reverenciada pela etnia Munduruku como lugar sagrado,  já não desponta mais no horizonte de quem vive à margem do rio Teles Pires, entre os estados do Pará e Mato Grosso. As corredeiras desapareceram em decorrência da construção da Hidrelétrica de Teles Pires, que em setembro deste ano teve suas obras embargadas por consistentes lacunas nos estudos de impacto do projeto e curiosamente já retomadas sem que fosse apresentada uma solução para os problemas apresentados pelo Ministério Público Federal. As devastadoras consequências estão claras aos olhos dos indígenas que vivem na região. As obras já encobriram as quedas d’água, inundaram o barramento do rio e afetaram a área de reprodução de peixes migratórios como o piraíba, pintado, pacu, entre outros.

E quem fala um pouco sobre o assunto é Sidney Apiaka (etnia afetada juntamente com os Munduruku e Kayabi), que é casado com uma Munduruku, com familiares que moram na aldeia de Teles Pires. Acompanhe a transcrição de uma conversa entre o Amazônia em Chamas e o indígena.

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Conversa com vídeo Sidnei Apiaka – Teles Pires

“Minha Família mora no Teles Pires, tenho família que mora na “Boca do Maruvi” na terra de Teles Pires… Inclusive fomos dá uma olhada lá na cachoeira de Sete Quedas, que eles falaram pra gente que a cachoeira tinha sumido, que não existia mais cachoeira com essa barragem. Ai a gente foi lá , quando a gente chegou lá no pé da cachoeira de Sete Quedas já não viu mais a cachoeira, já subiu tudo, porque a barragem ta enchendo muito lá em cima e a água muito suja, no rio, poluindo o rio. Peixe, que tinha muito peixe, já sumiu e pro outro lado dos kaiabi, os kaiabi falaram a mesma coisa, que lá em cima fica um pouco ruim por causa que vai prejudicar muito eles e nós aqui embaixo. Minha família mora lá, minha família de Apiaka que mora lá em cima.

Tu és Apiaka então?

Eu sou.

Como que era antes?

A cachoeira tinha Sete Quedas, tinha uma que descia, caia, corria um pouco e ai descia né, tipo uma escada assim. Coisa mais linda, quem de cima vê só fumaça, hoje em dia você chega lá e não vê mais nada, as ilhazinhas que tinha no meio, sumiu tudo.

Qual importância deste lugar para os Apiaka?

A importância de lá porque eles sobreviveram do rio e da mata, quer dizer, trabalhavam lá, tinha farinha, tinha a roça e hoje se acontecer isso mesmo que tá acontecendo de eles falaram que ainda vai encher mais um pouco, vai acontecer que vai afundar tudo e eles vão ficar desabrigado e eles vão pra onde, não tem pra onde eles irem, gente que já vem de fora lá e disse que eles não tem direito mais de nada lá na terra deles.

Chegaram pra falar lá com vocês?

Chegaram… Ai foi o tempo que teve essa base ai, o que aconteceu que ‘ele’ trabalhava na balsa, chegaram com bomba e detonando, humilharam o pessoal da aldeia tudo, ai botaram ao redor da pista tudo só bomba pra ele não poder correr , humilharam todo mundo, inclusive mataram um primo meu que tava lá.


Indígenas Munduruku ocupam sede da AGU em Brasília (DF)

Posted: December 11th, 2013 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on Indígenas Munduruku ocupam sede da AGU em Brasília (DF)

 

Publicada originalmente no site do Cimi

Fotos de Neuza Crixi repórter-munduruku diretamente de Brasília, acompanhe a sua cobertura pelo Facebook- Aqui

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Brasília – 10 de dezembro de 2013 – Cerca de 50 Munduruku de aldeias do Alto e Médio Tapajós, no Pará, ocupam desde o início da tarde desta terça, 10, a sede da Advocacia-Geral da União (AGU). O movimento ocorre por tempo indeterminado, sendo organizado pela Associação Da’uk, formada em uma assembleia de caciques Munduruku há pouco mais de um mês.

 

Os indígenas pedem ao ministro Luiz Inácio Adams a revogação da Portaria 303, a demarcação da Terra Indígena Munduruku no Médio Tapajós e que a AGU não recorra de decisão do juiz Illan Presser, da 1ª Vara da Justiça Federal de Mato Grosso, que suspendeu o leilão para a Usina Hidrelétrica de São Manoel, no Rio Teles Pires.

 

O leilão estava marcado para acontecer nesta sexta, 13. Se construída a usina no Rio Teles Pires, na divisa entre os estados do Mato Grosso e Pará, aldeias e locais sagrados dos povos Kayabi e parte das aldeias Munduruku serão inundados e deixarão de existir, o que promoverá diásporas e consequências insondáveis para a continuidade da vida destes povos.

 

Durante a ocupação da sede da AGU, uma comissão de Munduruku tentará audiência com o presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), o desembargador Mário Cesar Ribeiro. O objetivo é tentar sensibilizá-lo para que mantenha a decisão do juiz Presser pela suspensão do leilão. Durante a ocupação, os indígenas Munduruku distribuíram ainda uma carta contra a usina de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará.

 

“A Portaria (303) é ruim porque permite a construção de usinas em nossos rios sem consulta ao povo e também dificulta a demarcação das terras tradicionais, que no Médio Tapajós ainda não aconteceu”, explica Josias Manhuary Munduruku. A liderança frisa que a AGU é quem briga na Justiça para que os processos que envolvem a construção de UHE, PCH e barragens sejam executados. “AGU é inimigo nosso. Não faz nada de bom”, ataca.

 

Há quatro meses os Munduruku do Médio Tapajós aguardam a Fundação Nacional do Índio (Funai) publicar estudo identificando da terra indígena.

 

Resumo:

 Indígenas Munduruku ocupam sede da AGU, em Brasília (DF), pela revogação da Portaria 303, pela demarcação da Terra Indígena Munduruku no Médio Tapajós e contra as usinas hidrelétricas nos rios Teles Pires e Tapajós. Uma Comissão deverá sair da ocupação para tentar audiência com o presidente do TRF-1 para solicitar a manutenção de decisão que suspende o leilão da UHE São Manoel, no Rio Teles Pires, na divisa do Mato Grosso e do Pará.

Os Munduruku também distribuíram um documento que demanda celeridade da Justiça em todos os processos relativos a hidrelétricas nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires:

 

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Hidrelétricas nos rios Xingu, Teles Pires e Tapajós: Justiça Já!

 

No Dia Internacional dos Direitos Humanos, exigimos que se faça JUSTIÇA JÁ nos casos

de Belo Monte, Teles Pires e Tapajós.

 

“Nós, índios Juruna da Comunidade Paquiçamba nos sentimos preocupados com a construção daHidrelétrica de Belo Monte. Porque vamos ficar sem recursos de transporte,pois aonde vivemos vamos ser prejudicados porque a água do Rio vai diminuir, assim como a caça,vai aumentar a praga de carapanã com a baixa do Rio,aumentando o número de malária, também a floresta vai sentir muito com o problema da seca e a mudança dos cursos dos rios e igarapés (…)”

 

 

Trecho de carta enviada ao MPF, Altamira, 2000

Em 15 de maio de 2001, o Ministério Público Federal (MPF) no Pará ajuizou a primeira Ação Civil Pública (ACP) contra a Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte em resposta a uma carta dos indígenas Juruna, que relatava a extrema preocupação do grupo com os boatos de que o governo federal estaria retomando o mega projeto de barramento do Rio Xingu na região de Altamira, PA.

 

Mais de 13 anos depois, a população do Xingu vive o terrível fato de que seus piores pesadelos estão se tornando uma realidade. As previsões sombrias da primeira ACP do MPF também vão se concretizando, e hoje já são 20 as ações do órgão contra inúmeras violações da legislação ambiental e dos direitos humanos de indígenas, ribeirinhos, pescadores, agricultores e moradores das cidades impactadas pela usina, consagrados na Constituição Federal e em acordos internacionais dos quais o Brasil é parte.

 

Belo Monte, cujos canteiros de obra seguem se expandindo sobre o que antes era território dos povos do Xingu, se tornou um símbolo nacional e internacional dos equívocos de um desenvolvimentismo que atropela e destrói tudo em seu caminho em nome de um suposto crescimento econômico. Suposto, porque o alardeado crescimento do PIB de 4% a 5%, que embasou o Plano Decenal de Energia em 2012, morreu na praia com 2,5% em 2013, e deve ser ainda menor em 2014, de acordo com prognósticos de agências especializadas.

 

Nesse dia 10 de dezembro, quando se comemora o Dia Internacional dos Direitos Humanos, é essencial que a conta dos ilícitos cometidos pelo governo federal e seus parceiros privados em Belo Monte seja reapresentada ao país. Em especial, é essencial que se tenha clareza de que grande parte deles foi documentada, analisada e denunciada à Justiça que, omissa e leniente, tem permitido que sigam impunes e se repitam e se aprofundem de novo, e de novo.

 

Se tomarmos apenas as últimas ACPs do MPF, iniciadas entre o final de 2012 e o presente, desfilam absurdos cometidos pelo Consórcio Norte Energia. S.A. (Nesa, liderado pelo Grupo Eletrobrás) como o não cumprimento de 40% das condicionantes do licenciamento ambiental do empreendimento; informações falsas do empreendedor ao Ibama; sub-estimação da área de alagamento na zona urbana de Altamira (Cota 100), e ausência de cadastramento dos atingidos; violações da licença ambiental e novo descumprimento de condicionantes; irregularidades do empreendedor em cumprir a obrigação de aquisição de terras para os indígenas Juruna da aldeia Boa Vista, com danos graves, desagregação e risco à sobrevivência da comunidade; impacto sobre os indígenas Xikrin, moradores do Rio Bacajá; irregularidades nas obras de reassentamento dos moradores de Altamira a serem atingidos pelos alagamentos, modificação nos projetos originais sem anuência dos atingidos, desconformidade das construções com o código de obras da cidade, e muito mais.

 

Várias ações obtiveram liminares favoráveis, posteriormente derrubadas sem análise do mérito através da aplicação da Suspensão de Segurança, instrumento engendrado pela ditadura militar e generosamente aplicado por presidentes do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1). A maioria das ações aguarda, engavetada, julgamento em primeira instância, e outras tantas no TRF1.

 

Uma ação, em especial, ajuizada pelo MPF em 2006 e que cobra do Estado o respeito à Constituição no tocante ao direito das populações indígenas de serem consultadas em casos de empreendimentos que impactem suas terras (oitivas indígenas, artigo 231 da CF), está aguardando julgamento no Supremo Tribunal Federal. Ainda em novembro de 2012, o Movimento Xingu Vivo Para Sempre e seus aliados solicitaram à presidência do STF uma audiência sobre o caso, pedido reforçado pelo bispo da Prelazia do Xingu, Dom Erwin Kräutler, em abril de 2013, e novamente apresentado ao Supremo pelo Xingu Vivo e parceiros em 4 de dezembro deste ano.

 

Dezenas de outras ações de agricultores, pescadores, ribeirinhos e moradores de Altamira seguem paradas na subseção judiciária da cidade, enquanto se acumulam histórias de vidas destroçadas, misérias e sofrimentos. Longe de se condoer com esta situação, para reprimir os protestos dos atingidos, bem como os dos operários da usina, o governo federal enviou para Belo Monte a Força Nacional de Segurança, que passou a agir como guarda privada dos empreendedores da hidrelétrica.

 

Modus operandi semelhante passou a ser adotado nos complexos hidrelétricos da bacia do Tapajós, onde está prevista a construção de três grandes usinas no Rio Tapajós, e, em seus afluentes, quatro grandes barragens no Rio Jamanxim, cinco no Rio Teles Pires, e 17 no Rio Juruena (além de mais 80 pequenas centrais hidrelétricas – PCHs), que estão em colisão direta com Terras Indígenas, territórios ribeirinhos e Unidades de Conservação.

 

As ofensivas do governo federal, lideradas pelo Ministério de Minas e Energia (MME) e a Advocacia Geral da União (AGU) que marcam os projetos da bacia do Tapajós vão na mesma direção de Belo Monte: decisões políticas sem consulta aos povos indígenas e sem análise de impactos cumulativos, violando a legislação brasileira e normas internacionais, como a Constituição e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); atropelos e pressão sobre órgãos de licenciamento (Funai, Ibama, Iphan); e repressão e tentativas de cooptação de movimentos de resistência, com especial ênfase dos indígenas Munduruku e Kayabi.

 

Em construção, a UHE Teles Pires, no Rio Teles Pires, foi objeto de duas ACPs do MPF que apontaram graves violações de direitos e falhas no Estudo de Componente Indígena. Em setembro deste ano o TRF1 decidiu pela paralisação das obras; porém, mais uma vez, a pedido da AGU, foi aplicada a Suspensão de Segurança pelo presidente do STF em exercício – alegando “grave ofensa à ordem econômica”, permitindo a retomada dos trabalhos, ignorando os direitos fundamentais da pessoa humana. Com isso, instaura-se uma verdadeira política da indiferença em relação aos povos e comunidades afetadas por grandes empreendimentos na Amazônia brasileira, autorizando as mais diversas violações de direitos fundamentais e ambientais.

 

Também no Rio Teles Pires, o setor elétrico propõe a construção da UHE São Manoel, que ficaria a poucos metros do limite da TI Kayabi. Com licenciamento suspenso temporariamente em 2011 após protestos dos indígenas Munduruku, Kayabi e Apiaká, o projeto foi retomado após fortes pressões da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) sobre o judiciário, o Ibama e a Funai. De acordo com o (incompleto) Estudo de Componente Indígena, os impactos da usina sobre os indígenas são tão graves que a tornam inviável, posição sustentada pela Funai até novembro deste ano. Estranhamente, sem resolver os problemas apontados por seus técnicos, no dia 27 daquele mês a presidência da Funai mudou de posição através de um ofício ambíguo ao Ibama, e, dois dias depois, saiu a Licença Prévia (LP) do projeto para que fosse a leilão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) neste próximo dia 13.

 

Já no Rio Tapajós, o governo armou nova operação de guerra para viabilizar os estudos das usinas de São Luiz do Tapajós e Jatobá. Assim como em Belo Monte, mandou para a região seu braço armado, a Força Nacional de Segurança, para controlar a resistência dos Munduruku, que não aceitam o projeto sobre o qual nunca foram consultados e que afeta diretamente seus territórios e modos de vida.

 

Paralelamente, o governo federal diminui inconstitucionalmente, por Medida Provisória, mais de 75 mil hectares de cinco Unidades de Conservação para possibilitar a construção das usinas de São Luis do Tapajós e Jatobá. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) da Procuradoria Geral da República referente a estes crimes permanece, desde fevereiro de 2012, sem apreciação da Justiça no STF.

 

Cabe ressaltar, por fim, que a construção de hidrelétricas na Amazônia só tem sido possível graças aos generosos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e outros bancos públicos, que utilizam o dinheiro dos contribuintes brasileiros, sem um mínimo de transparência sobre critérios de análise de riscos e da viabilidade socioambiental e econômica de projetos, e na ausência de mecanismos efetivos para garantir o respeito aos direitos das populações afetadas e outras obrigações de responsabilidade socioambiental dos empreendedores, contando com a baixa aplicação de sanções pelo Ibama.

 

Demandas

 

Considerando as graves violações dos direitos humanos e da dignidade da pessoa humana e das ameaças às instituições democráticas, de forma que nos faz reviver o período sombrio da ditadura militar, conclamamos à toda sociedade a se juntar a nós e exigir JUSTIÇA JÁ para os atingidos e ameaçados por Belo Monte e pelos projetos da bacia do Tapajós. Exigimos:

 

* Que todas as instâncias da Justiça cumpram seu papel e julguem, com celeridade e idoneidade, o mérito de todas as ações relativas ao projetos hidrelétricos na Amazônia, extirpando e sanando os descumprimentos da Constituição, da legislação ambiental e da Convenção 169 da OIT;

 

* Especificamente em relação a Belo Monte, que o STF julgue o mérito da ACP sobre as oitivas indígenas e garanta seu direito constitucional de consulta pelo Congresso Nacional;

 

* O mesmo deve se aplicar aos projetos hidrelétricos nos rios Tapajós, Teles Pires e Juruena: que os indígenas sejam consultados, com poder de veto, sobre a construção ou não das hidrelétricas planejadas;

 

* Em relação à UHE São Manoel, que a usina seja retirada do leilão de energia A-5 de 13de dezembro de 2013 e o processo de licenciamento seja cancelado até o julgamento das ações do MPF. E, em especial, que nenhuma ação para implantação das usinas seja feita antes da realização da consulta aos povos Kayabi, Munduruku e Apiaká;

 

* Em relação à UHE Teles Pires, que seja derrubada pelo Supremo a Suspensão de Segurança do presidente em exercício que permitiu a retomada das obras;

 

* Que o STF julgue a Ação Direta de Inconstitucionalidade 4717 sobre a desafetação ilegal das Unidades de Conservação da bacia do Tapajós;

 

* Que seja erradicada definitivamente do arcabouço legal do país a legislação sobre a Suspensão de Segurança;

 

* Que seja decretada uma moratória no licenciamento e na construção de barragens na região amazônica até a realização de estudos sobre impactos cumulativos em nível de bacia hidrográfica e dos processos de consulta livre, prévia, consentida e informada, conforme a Constituição Brasileira e a Convenção169 da OIT.

 

 

BELO MONTE, JUSTIÇA JÁ! TELES PIRES JUSTICA JA! TAPAJÓS JUSTIÇA JÁ!

 

 

Altamira, Santarém e Alta Floresta, 10 de dezembro de 2013


2ª reunião do Movimento Ipereg Ayu: mais um passo na resistência munduruku

Posted: November 13th, 2013 | Author: | Filed under: Geral | 73 Comments »

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Indígenas da etnia e parceiros de luta se encontraram para organizar e discutir agenda das próximas ações contra a construção das hidrelétricas

 

Foram cinco dias de conversas que se estendiam pela noite. Justificável: é rara uma situação em que mais de 400 indígenas de 62 aldeias da etnia munduruku tem a oportunidade de se encontrar para debater {trocar experiências e relatos} a respeito dos impactos iminentes do projeto federal que prevê a construção de barragens na região em que habitam.

Entre os dias 1 e 5 de novembro, diversas representações deste povo – junto com parceiros, ribeirinhos também afetados e órgãos como Funai e Ministério Público Federal – se encontraram à margem do rio Tapajós, na aldeia polo base Restinga, para discutir os rumos do Movimento Ipereg Ayu – organização indígena de luta contra a construção das hidrelétricas previstas no PAC.

A pauta da reunião indicava a urgência desse encontro. Feita de forma aberta, podendo qualquer munduruku opinar ou adicionar pontos, ela continha mais de vinte itens – tendo destaque no debate a estruturação do movimento Ipereg Ayu e ações para o fortalecimento da resistência ao projeto federal, firmando uma agenda autônoma de ações para 2014. Vale a pena ressaltar alguns direcionamentos e decisões que apontam novos rumos na luta.

Associação Pusuru é extinta e transformada em Da’uk

Desde a reunião claramente arbitrária realizada em Jacareacanga, no dia 3 de agosto, parte significativa dos indígenas da etnia munduruku já não se viam representados pela Associação Pusuru. A insatisfação tem motivos. A referida assembleia trocou a direção da entidade desconsiderando a opinião dos caciques – que nos mais de vinte anos de existência da associação tradicionalmente eram os responsáveis pela escolha do corpo diretório. Ao invés de se configurar numa reunião interna da etnia, o encontro contou com a intervenção de vereadores e prefeitura de Jacareacanga, além de forte aparato policial, inibindo a livre escolha participação dos munduruku presentes.

Por conta disso, o movimento Ipereg Ayu extinguiu a associação e criou uma nova entidade representativa para a etnia. A Da’uk (que em munduruku significa taoca, espécie de formiga conhecida por caminhar em coletividade) teve sua diretoria escolhida pelos mais de 60 caciques presentes.

Integram a nova associação Ademir Kaba (coordenador), Reginaldo Poxo (vice-coordenador), Ismael Akay (primeiro secretário), Antônio Saw (segundo secretário), Edivaldo Poxo (tesoureiro), Artemizia Manhuary (primeira fiscal) e Solano Akay (segundo fiscal). De acordo com Josias Manhuary, chefe-geral dos guerreiros e coordenador da 2ª reunião do movimento Ipereg Ayu, a partir de agora as reuniões da entidade ocorrerão somente em aldeias. “Vamos trazer a Da’uk mais para perto da gente. Não temos que nos encontrar na cidade, mas sim dentro do nosso espaço, sem a interferência de ninguém”.

Com as novas mudanças, o Conselho Indígena Munduruku do Alto Tapajós (CIMAT) também se renova e agora se chama Conselho Indígena Munduruku Pusuru Kao do Alto Tapajós (CIMPUKAT), coordenado por Ceso Tawe e com os demais conselheiros, entre eles, Francisco Waro, Raimundinho, Samúna Fanesa Manhuary, Valderino Waro Patauazal.

No link, veja a carta divulgada pela Da’uk.

Movimento Ipereg Ayu

A estruturação do movimento Ipereg Agu teve destaque nas discussões. Atuando desde o início de 2013, o grupo tem se dedicado ao fortalecimento das bases de luta contra as hidrelétricas, em um trabalho que visa principalmente à união do povo munduruku em prol da preservação de sua identidade e território, aspectos culturais ameaçados pelos grandes projetos.

Neste percurso, o movimento cada vez mais tem recebido apoio de lideranças locais das diversas aldeias situadas no Rio Tapajós, Teles Pires, Rio das Tropas, Kabitutu, entre outros. Na reunião foi decidida a permanência do mesmo grupo à frente do movimento, composto por Josias Manhuary, Adalton Akay, Maria Leuza Kaba, Neuza Kirixi, Francineide Koro, Reginaldo Kaba, Zenóbio Manhuary, Ana Poxo e Adailton Paygo, fotógrafo da organização.

Decidiu-se também pela realização de duas assembleias anuais, sempre realizadas em aldeias. E a próxima já tem data marcada: dia 19 de abril, na aldeia Missão São Francisco, no Rio Cururu.

Outro assunto evidenciado nas conversas diz respeito às legislações internacional e nacional que garantem direitos das populações indígenas, como a Declaração das Nações Unidas sobre o direito dos povos indígenas e a Convenção 169 da OIT – leis violadas pelo governo brasileiro quando ignora a realização da consulta prévia, assunto abordado pelo procurador-geral da república, Felício Pontes, na reunião. (Veja aqui mais informações sobre o debate)

Também foi debatida a mudança da nomenclatura “área” para “território mundurucu” ao espaço reconhecido pela população indígena como local de existência e resistência histórica da etnia, além da retirada dos brancos do mesmo.

De acordo com Josias, chefe-geral dos guerreiros munduruku, a luta tende a se aprofundar com os novos passos do Ipereg Ayu. “Não iremos desistir de lutar por aquilo que é nosso por direito. A própria Constituição brasileira reconhece isso. Nossas águas, florestas, animais e plantas são coisas sagradas, sem tudo isso nossa cultura será perdida. Então iremos nos fortalecer para lutar pela nossa identidade e modo de vida. Organizados somos fortes”, ressaltou o chefe.

Amazônia em Chamas apresenta série sobre a Saga Munduruku

A partir desta semana, o blog Amazônia em Chamas apresenta uma série de reportagens-relatos-entrevistas-transcrições com os materiais produzidos durante a estadia da equipe na aldeia Restinga. Para acompanhar, acesse nossa página www.amazoniaemchamas.noblogs.org.

 


Vale, o maior saque de minério do mundo

Posted: October 22nd, 2013 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on Vale, o maior saque de minério do mundo

Fonte: Brasil de fato

Mapa obtido pelo Brasil de Fato mostra que o maior projeto de minério do mundo, o S11D, já estava projetado na década de 1980

21/10/2013

Márcio Zonta,

correspondente no Pará

A mineradora Vale prepara outro Programa Grande Carajás. A empresa vai explorar a partir dos próximos anos uma jazida de minério de ferro considerada a maior do mundo na Serra Sul de Carajás, no Pará.

O projeto conhecido como S11D, já em fase de implantação, será o maior investimento de uma empresa privada no setor mineiro no Brasil. São 40 bilhões de reais destinados à nova mina, usina e logística, que envolve a expansão da Estrada de Ferro de Carajás – EFC e a ampliação do Porto de Itaqui, em São Luis (MA).

Em 2016, o Projeto Ferro Carajás S11D terá uma estimativa de extração de 90 milhões de toneladas métricas de minério de ferro. A quantidade preenche 225 navios conhecidos como Valemaz, o maior mineraleiro do mundo.

Assim, a Vale passará a explorar na Serra de Carajás, com o Projeto de Ferro Serra Norte, efetivado desde 1985 e o S11D, 230 milhões de toneladas métricas de minério anualmente. A produção atual é de 109 milhões de toneladas por ano.

Embora a mineradora trate o S11D como uma novidade e parte da imprensa nacional frise o empreendimento como a redescoberta de Carajás, a exploração da Serra Sul estaria há muito tempo nos planos da Vale.

É o que denota um mapa (veja abaixo), ao qual a reportagem do Brasil de Fato teve acesso, elaborado pela então Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) – antiga estatal – em 1984, onde o plano de extração do corpo mineral da parte sul da Floresta Nacional de Carajás já está presente.

Plano de extração do corpo mineral da parte sul da Floresta Nacional de Carajás já está presente em mapa de 1984. Arte: Marcelo Cruz

Para especialistas no assunto, o mapa evidencia ainda com mais clareza a escandalosa privatização fraudulenta da Vale, e aponta para um dos maiores saques de minério do mundo.

“A Vale sempre falou nesse projeto, a empresa sabia de sua capacidade antes mesmo da privatização”, ressalta Frederico Drummond Martins, analista ambiental, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, responsável pela Floresta Nacional de Carajás. 

O novo velho projeto

No Relatório de Impacto Ambiental do Projeto Ferro Carajás S11D, a Vale menciona que os trabalhos de pesquisa realizada na jazida mineral da Serra Sul tiveram início no final dos anos de 1960. Porém, o documento cita que foram entre os anos de 2003 e 2007, que se aprofundaram os estudos no bloco D, do corpo S11.

Segundo a notificação, somente em 2008 o resultado da análise das amostras indicou uma reserva de minério lavrável de um montante de 3,4 bilhões de toneladas de minério no local.

Porém, para Frederico, muito antes disso a mineradora teria conhecimento da quantidade de minério na região a ser futuramente explorada. “Não só a empresa, mas o governo brasileiro também sabia. Na época da privatização a Vale já possuía decreto de lavra para a Serra Sul”, denuncia.

As obras para o ramal ferroviário estendido da EFC até a jazida da Serra Sul, conseguido há pouco pela Vale, numa licença junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), é apontado no mapa de 1984, e citado na legenda do gráfico como “Ramal Ferroviário Projetado”.

Dessa forma, o mapa aponta que existia uma pré-concepção de exploração da S11D, ressaltando ainda mais a espoliação que significou a privatização da Vale.

Patrimônio público

Em 1997, a mineradora foi incluída no Plano Nacional de Desestatização (PND), uma política implantada pelo presidente em exercício Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que visava privatizar 70% do patrimônio nacional para pagamento da dívida brasileira.

A mineradora foi vendida por R$ 3,3 bilhões de reais. O valor estimado na época do leilão era de R$ 92 bilhões de reais, ou seja, valor 28 vezes maior do que o que foi pago pela empresa.

Porém, o critério de avaliação do valor da mineradora escolhido pelos bancos, entre eles o Bradesco, considerou apenas o fluxo de caixa existente no momento da aquisição, sem levar em consideração o potencial das jazidas processadas da Serra Norte e o imenso poderio da reserva mineral da Serra Sul, estimado em 10 bilhões de toneladas de minério.

“Esse projeto de novo não tem nada, inclusive quando compraram o subsolo da Serra de Carajás na privatização eles já tinham conhecimento desse tanto de minério, o mapa é claro e mostra isso. É o maior saque de minérios do mundo!”, indigna-se Raimundo Gomes Cruz, sociólogo do Centro de Educação, Pesquisa e Apoio Sindical (CEPASP) no Pará.

Por que agora?

Estudos geológicos apontam que a Serra Sul tem potencial maior do que a vizinha Serra Norte, onde já está localizada a maior mina de ferro do mundo.

A exploração do S11D será apenas uma parte das 45 formações de minério de ferro que compõem a cordilheira Serra Sul. Ainda mais outros corpos, A, B e C futuramente serão explorados pela mineradora.

O projeto S11D constante nesse mapa histórico da antiga estatal CVRD, sairia num momento estratégico do papel para se tornar realidade.

Conforme explica o professor de economia da Universidade Federal Fluminense, Rodrigo Santos, o mercado de minério de ferro é extremamente concentrado, de modo que mais de 2/3 da oferta global da matéria prima depende da Vale, e das mineradoras anglo-australianas BHP Biliton e da Rio Tinto.

“A Vale, nesse caso, vem apostando no S11D como seu principal projeto, porque esse tem potencial para ampliar suas vantagens como líder nesse mercado”, avalia Rodrigo.

Ademais, em tempos de espionagem dos Estados Unidos e Canadá ao Ministério de Minas e Energia (MME), o S11D, seria inclusive uma das preocupações dos concorrentes, pois demarcaria ainda mais a liderança do mercado global da Vale frente a Rio Tinto e BHP Billinton, respectivamente segunda e terceira no ranking mundial de extração mineral.

“Considerando essa estrutura oligopólica e as características dos mercados de bens minerais, o controle e substituição de reservas de classe mundial, como Carajás, constitui uma das principais estratégias de competição”, explica Santos.

Segurança Nacional?

A região de Marabá, da qual a Serra de Carajás fazia parte na década de 1980, era submetida ao Grupo Executivo das Terras do Araguaia – Tocantins (Getat), criado em 1980 pelo regime militar com a finalidade de executar as medidas necessárias à regularização fundiária no sudeste do Pará, norte de Tocantins e oeste do Maranhão.

O órgão era vinculado à Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional. O mapa elaborado pela Vale em 1984, continha informações territoriais do Getat.

Flavio Moura, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e historiador da região, relata que o Getat era uma saída militar para controlar o conflito pela posse de terra na região, além de garantir a estratégia ditatorial da época de implantação dos grandes projetos na Amazônia. “O Estado militarizado foi o testa de ferro do capital nessa parte do país”, diz.

Ao observar o mapa, Moura não tem dúvida: “Esse material nos dá a imensidão do controle dos recursos naturais da região, por isso vemos por que a Guerrilha do Araguaia foi exterminada e qualquer forma de movimentos sociais é combatida pela aliança militar-empresarial, como foi o Massacre de Eldorado dos Carajás”, define.

A reportagem do Brasil de Fato submeteu o mapa, também, a um topógrafo aposentado do Exército de Marabá. Humberto Martins Fonseca relembra que a região de Carajás sempre foi alvo de maior proteção e intervenção militar.

“A ideia que passavam para gente era que tinha muita riqueza no subsolo de Marabá, por isso teríamos que defender esse patrimônio”.

Passados 30 anos do programa de exploração de minério no Pará, Fonseca reflete. “Hoje vemos no que deu, na verdade não estávamos protegendo as riquezas de ninguém, somente de nós mesmos, porque estamos entregando tudo e ficando sem nada”, lamenta.

Foto: Agência Vale

“DIVIDE ET IMPERA”: Intervenção Federal gera Conflitos e Violências na Região

Posted: October 10th, 2013 | Author: | Filed under: Geral | Comments Off on “DIVIDE ET IMPERA”: Intervenção Federal gera Conflitos e Violências na Região

Fonte da notícia: Conselho Indigenista Missionário – Cimi

Por Dom Erwin Kräutler

Bispo do Xingu e presidente do Cimi

 

Atribui-se ao imperador romano Júlio César (+44 a.C.) a expressão “Divide et impera”. O  ditado sugere que para um povo perder sua força e seu brio e assim ser mais facilmente dominado, a estratégia é dividir, criar discórdia, jogar uns contra os outros. Provocar a divisão entre os povos e populações locais é uma estratégia histórica e sistematicamente usada pelos governos e grupos econômicos interessados na exploração dos recursos naturais até então de usufruto exclusivo destes povos e populações.

Os governos e grupos econômicos usam esta estratégia da divisão para romper ou enfraquecer a resistência destes povos que, evidentemente, não se conformam e não aceitam o fato de terem suas terras invadidas, sua cultura agredida, seus projetos de vida destruídos.

Os governos e grupos econômicos não hesitam em provocar, favorecer e alimentar fraturas políticas entre potenciais aliados dos povos e populações locais que se opõem aos seus interesses. Usam esta artimanha a fim de colocar em lados opostos pessoas e organizações que poderiam estar articuladas e atuando conjuntamente no apoio e fortalecimento da resistência destes povos e populações.

Os governos e grupos econômicos defendem a tese segundo a qual os povos, populações locais e organizações de apoio seriam os “sujeitos da violência” nesses processos. Por isso, qualquer mobilização que se contraponha aos interesses do governo e dos grupos econômicos é rotulada de  “baderna”, “arruaça”, “confusão”, “agitação”, “violência”. É o típico caso de “culpabilização da vítima”. Tentam assim camuflar o fato de que são eles próprios os protagonistas da violência e justificam o uso da força policial do Estado para implementar seus interesses. Invariavelmente aplicam a estratégia da “criminalização” de lideranças a fim de enfraquecer qualquer resistência.

Os governos e grupos econômicos nunca assumem a responsabilidade pelos desequilíbrios e fraturas políticas. Sempre jogam a culpa em alguma organização, alguma pessoa ou grupo de pessoas que atuam nas respectivas regiões.

Essas premissas se aplicam hoje perfeitamente à região do Tapajós, onde o governo pretende construir o chamado “Complexo Hidroelétrico do Tapajós”. Representantes do governo bem treinados e desprovidos de qualquer tipo de senso ético atuam com grande afinco na região, de modo especial junto aos Munduruku, povo que impõe a maior resistência ao projeto governamental.

Preocupados damo-nos conta de que o governo federal e os grupos econômicos têm alcançado relativo sucesso nesta estratégia, especialmente no que tange à provocação de divisões e desequilíbrios entre os Munduruku e potenciais aliados deles na região. A obstinação do governo federal em cumprir o calendário de viabilização do Complexo Hidroelétrico do Tapajós está causando sérios conflitos e violências. A “divisão interna” provocada pela intervenção federal entre os Munduruku e daqueles que lutam em defesa do projeto de vida do povo, contribui para que o governo, as empreiteiras e os grupos econômicos avançam, desdenhando de quem não reza por sua cartilha, na implementação de seu projeto de morte.

O momento exige bom senso, serenidade, ausculta aguçada às necessidades do povo e diálogo entre caciques, guerreiros e demais lideranças Munduruku na busca de consenso sobre as formas de ações que possam efetivamente impedir a construção das hidroelétricas no Tapajós e a consequente desestruturação do povo.

Afirmamos nosso compromisso e disposição de apoio irrestrito à luta dos Munduruku contra os projetos de morte que os ameaçam.